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17.Fev.20

SER ESCRITOR É COOL | 2º Desafio | Trabalhos Pontuados - 3º ciclo

Divulgamos os trabalhos pontuados neste segundo desafio. Parabéns a todos

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Agrupamento de Escolas de Castelo de Vide

Nelson Zambujo, 8ºano

Tudo aquilo que pode ser o Natal

Dezembro, Ontário, Canadá, ano de 1960, mais precisamente na aldeia da Montanha Azul... Para o senhor Button fazia agora uma década de desconsolo, dez anos sem a sua querida esposa Mary, tinha falecido vítima de um ataque fulminante de coração, como era isso possível? Logo ela, que tinha o melhor coração que ele conhecera, era tão forte e bonito ao mesmo tempo… Mary era tudo para ele.

Button olhava agora a neve acumulada no topo das árvores, o chão coberto por aquele manto branco e lembrava-se do cabelo de Mary, também branco, sedoso e perfumado; lembrava-se dos seus olhos castanhos, doces e meigos… a meiguice de Mary era tão pura, simples e aconchegante como o presépio agora iluminado por baixo da árvore de Natal. Ah, como eles adoravam o Natal!

Mary era uma fonte divina, nunca deixou um sem abrigo sem pão ou esmola, chorava muito por todos aqueles que viviam ao relento, chegou a trazer alguns para a ceia de Natal, por vezes, parecia a mãe de todos eles. Nunca tinham tido filhos e esse era um grande desgosto para ambos, por isso Button não dizia nada quando Mary se apegava a alguém que podia ajudar, ele próprio também ajudava os mais necessitados,

 

Button continuava a olhar para a montanha cheia de neve, quando viu Edith sair de casa. Edith era uma vizinha atenciosa, fazia algum tempo que Button sentia que Edith nutria por ele um carinho especial. Era uma mulher mais nova e muito bonita, convidava-o todos os anos para a ceia de Natal. Edith também era viúva e não tinha filhos, mas Button recusava sempre gentilmente os seus convites, dizia-lhe educadamente que passava o Natal com José, Maria e o Deus menino. Contudo, Button tinha medo de se apaixonar por Edith. Olhava-se e via as suas mãos enrugadas e calejadas, o corpo ligeiramente encurvado, a bengala também não o favorecia, sentia-se velho demais para Edith. E, por outro lado, podia ser que aquilo que sentia fosse uma artimanha da sua mente envaidecida, porque carga de água Edith estaria interessada nele? Não queria fazer figuras tontas, nem partir o seu pobre coração, já por si completamente desfeito.

Edith caminhava ao encontro dele, sorriu e disse-lhe:

- Bom dia, senhor Button, desculpe incomodá-lo, tenho um convite para si. Gostaria muito que viesse passar a noite de Natal comigo, até já comprei o melhor presunto que encontrei na aldeia, sei que aprecia muito essa iguaria, não vou aceitar um não como resposta.

Disse-o muito determinada duma assentada só. Button ficou ligeiramente corado, parecia que, por momentos, não conseguia falar nem respirar. Ia responder quando Edith, por sua vez, com a voz mais suave disse:

- Por favor não me venha dizer que passa a noite com José, Maria e Jesus, porque isso passamos todos...

Button só conseguiu dizer que ia pensar com carinho na oferta. Edith ficou triste, gostava dele mais do que queria e por ela estariam juntos fazia tempo.

Button reparou na expressão desolada da vizinha, começou a tremer por dentro, arranjou uma desculpa e meteu-se novamente em casa, Deu de caras com a sua árvore de Natal, cheia de bolinhas vermelhas, com o presépio da sua amada Mary. Lembrou-se da capela pequenina onde havia casado e jurado amar Mary para toda a vida. Porém, ela tinha partido, deu-se conta de que ele também deixara de viver, fechado naquele amor sem retorno, sem resposta. A solidão deixara-o velho e triste, amedrontado com o novo, como poderia ele amar outra vez? Porque raios estava ele agora a tremer tanto? Edith tirava-o do sério, fazia sacudir a sua pele velha, parecia que um homem novo estava a nascer por dentro, um homem com vida e sem medo.

Os dias passaram e Button evitou Edith, ao ponto de a ter visto na praça da aldeia a admirar a bonita e grande árvore de Natal que por estes dias era o centro das atenções, decorada a preceito com tons natalícios. Button desviou-se, meteu-se a caminho por um atalho e desapareceu imediatamente dali. Confrontar Edith estava fora de questão, não a queria magoar, não queria arriscar.

O dia amanheceu ensolarado e, finalmente, era véspera de Natal. Button recordou Mary, desde crianças que brincavam juntos e era com grande alegria e entusiasmo que as crianças aguardavam o Natal, trocavam sempre entre eles prendas simbólicas, bilhetinhos de amor ou pedrinhas da bonita Montanha Azul. Desde sempre conhecera Mary, partilhou tudo com ela e estava decidido a preparar mais uma ceia de Natal. Acendeu a lareira ou antes fez um lume de chão, o crepitar de uma lareira acesa aquecia-lhe o coração. A velha cafeteira não poderia faltar com café sempre forte, lembrou-se que Mary adorava café forte, principalmente feito por ele. A mesa estava posta, peru assado, um bom vinho e um doce que tinha comprado na pastelaria da aldeia. Já era tarde, preparou então duas cadeiras, uma para ele, outra em memória de Mary, era sempre assim desde a morte da sua amada. Sentou-se calmamente, fechou os olhos e, sem se aperceber, começou a chorar, chorava copiosamente, como chegou ele a ficar tão só? Porque não aceitou o convite? Ao menos poderia ter convidado os sem abrigo, pensou ele com um sentimento de raiva e culpa.

- Velho tonto… - recriminou-se ele em voz alta. - Estás velho e amargo, egoísta até! A Mary, onde quer que esteja, deve estar muito infeliz com esta minha solidão.

Sem pensar mais, saiu porta fora, direito à casa de Edith. Nevava muito e o frio cortava a pele, correu o mais depressa que pôde, bateu à porta de Edith e rezava para que ela estivesse por lá.

Edith ao abrir a porta, ficou aflita:

- Senhor Button, o que se passa? O seu casaco, a sua bengala? Onde estão? O que aconteceu?

Button desatou a rir, ria como uma criança e, com a voz ainda ofegante, disse-lhe:

- Minha querida Edith, nem me lembrei do casaco, nem da bengala. Na verdade não me fazem falta, não sinto falta, o que sinto é que...

Ficaram a olhar um para o outro, Edith, muito espantada, sorriu e disse num tom alegre:

- Não acredito, Sr Button, aceitou o meu convite?!!! Já tinha perdido a esperança, sabe?!

Button respondeu com a voz segura:

- Edith, venho aqui dizer-lhe que não posso aceitar o seu convite.

Edith ficou pálida, que crueldade…

- E então? Só me diz isso agora? Mais valia não dizer nada...

Ia fechar a porta com força, quando Button agarrou a porta com a sua mão firme:

- Edith, eu venho convidá-la para ir passar o Natal na minha casa! Desculpe ser em cima da hora, posso ser velho, mas sou um cavalheiro e fazia muito gosto que viesse comigo. Por favor, atenda o pedido deste pobre velho que gosta muito de si!

Edith, ainda pasmada e incrédula, aceitou. Entretanto, Button lembrou-se, de repente, do presunto e, com um sorriso no rosto, pediu-lhe cheio de humor se Edith poderia levar o presunto prometido para a ceia de Natal em sua casa.

- Como é que me esqueci de comprar presunto?!

Enquanto embrulhava a iguaria, Edith respondeu:

- Senhor Button, não o comprou de propósito, sabia perfeitamente que eu o tinha aqui!

- Deixe lá o senhor, trate-me por Button apenas! Sou o seu Button, se quiser… E isso que disse deve ser verdade, pena que só o percebi hoje!

Edith sorriu muito feliz e deu a mão a Button enquanto caminhavam para casa.

Button estava feliz, sorria, contemplava a Montanha Azul coberta de neve, suspirava. Esta noite, ele tinha percebido que a vida são as quatro estações e que era de montanhas verdes e primaveras que o seu gelado coração precisava. Prometeu a si mesmo, naquele momento, nunca mais largar a mão de Edith, nunca mais sentir medo do amor. Afinal era Natal e tudo o que o Natal pode ser estava com ele!

Em silêncio, José e Maria contemplavam Button e Edith. Enquanto isso, o Deus Menino segredou ao ouvido de Mary:

- Descansa em paz!

 

 

 

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Agrupamento de Escolas do Bonfim, Portalegre

Leonor Lourenço & Maria Leonor Figueira, 7ºano

A Menina- Pássaro

Era uma vez, uma menina muito bonita, mas muito triste e sozinha. Pelo menos ela sentia-se assim. Ela vivia numa aldeia encantadora. Numa casinha pequenina rodeada de árvores, flores e com muitos animaizinhos. Adorava especialmente os pássaros. A menina não tinha pai nem mãe, estes tinham falecido quando ela era muito pequena, no entanto, um casal que não podia ter filhos criou a menina. Apesar do amor e carinho que lhe davam, a menina não de sentia feliz. Sentia que não pertencia àquele lugar.

Os dias da menina eram sempre iguais. Levantava-se, fazia as tarefas que a “mãe” lhe pedia. Como nunca se ria as pessoas começaram a troçar dela e a chamar-lhe nomes. Ela não se importava. Só à noite, quando estava a ler sobre lugares distantes, a menina esboçava um sorriso.

Ao adormecer na sua cama quentinha, sonhava, sonhava.

O estranho é que o sonho era sempre o mesmo. Ela sonhava que corria pelos campos, acompanhada com os pássaros que tanto adorava. Quanto mais depressa corria, mais os pés iam saindo do chão, ela ganhava asas e voava com os seus amigos, visitava lugares distantes e diferentes. Sentia-se livre, feliz, sentia que aquele era o seu lugar.

Certo dia, ao acordar, depois de mais um sonho maravilhoso, reparou que lhe tinham crescido umas asas. Que estranho que tinha acontecido àquela menina. Quem teria o poder de, a magia, para fazer tal coisa! Não é normal crescer asas às meninas. Terá sido a sua mãe, que ao ver a tristeza da filha lá do alto de onde a via, terá dado as asas?!

A partir desse dia, a menina começou a voar pelos céus, visitava novos sítios, era feliz pertencia ali. Mas todas as noites voltava para casa e para o casal que a tinha acolhido com tanto amor e que a aceitava como ela era agora, UMA MENINA-PÁSSARO!!

 

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Agrupamento de Escolas nº 2 de Abrantes

Beatriz Grácio, 8ºano

Palavras Faladas, Contas Contadas

- “Ya”, tipo, eu ia para fazer, “stora”, mas o “site” não tinha muitas cenas p’ra ver e não havia, tipo, cenas para escrever. Topa?

Toda a turma olhou. Não era possível! A professora ainda estava mais incrédula que todos eles, embora não quisesse mostrar.

- Mariana, é “professora” e não “stora” e, dentro de uma sala de aula, não se diz “cenas”, mas sim “coisas”. E isso do “ya” é em alemão; aqui diz-se “sim”. Ah, e não, eu não topei nada, eu entendi. O que queres dizer é que não conseguiste obter informação suficiente para o trabalho, é isso?

- Pois, pois, whatever...

- O quê?! Disseste alguma coisa, Mariana?

- Não, não…

Sara lembra-se da avó. Se ela estivesse ali agora, fazia de si uma santa.

- Ó Sara, cala-te! Não digas essas coisas! Ai! O mundo, daqui a uns anos, está perdido! Os jovens de agora só falam com essa língua fundada por eles próprios! Essas palavras, como “tipo”, “ya”, “búe”, não fazem parte do português original!

Bastava Sara perguntar: “‘Tá tudo bem, ‘vó?” Que a avó ficava fula. Não havia quem a fizesse parar de barafustar e resmungava até se cansar. Dizia que “tá” era uma interjeição, com o significado de “basta” ou “alto”, e não um verbo. Que “vó” não existia, por isso, não era nenhum grau de parentesco nem nenhum vocativo. Que Sara tinha de perder a mania de falar mal e que os jovens não deviam inventar palavras para a “linda língua” com a qual fomos premiados. Que o português já tinha palavras suficientes e, como tal, não havia necessidade de inventar outras. Que, assim, o “lindo idioma” de Portugal se vai destruir. Que isto e que aquilo e que aqueloutro. Só se calava quando começava a telenovela. Se a estivesse a ver, quase não reclamava.

 

- Ai os jovens de hoje em dia a destruir o português sem mais nem menos! Esta língua estrangeira que a juventude agora fala vai destruir a melhor língua do mundo - dizia apenas se a neta dissesse algo errado, enquanto via concentrada “Jardim dos Afetos”.

A avó Luísa tinha uma adoração pela “linda língua portuguesa”. Qualquer outra já não era tão boa.

O francês era muito complicado. (“Porque têm eles tantos verbos? E porque carregam tanto nos “R”? E para que será aquela pronúncia tão difícil?”)

O espanhol era muito esquisito. (“Porque escrevem eles “NH” com “N e um til”? O til serve para outras coisas! Para nasalar as vogais, por exemplo!)

O inglês era muito conhecido. (“Agora, toda a gente fala inglês! Inglês para aqui, inglês para ali, e, daqui a pouco, o inglês é a única língua que se fala!”)

O italiano era só “Mama Mia” e só falavam com as mãos! (”Sinceramente, para quê tanto «Mama Mia»? E porque falam eles com as mãos e não com a boca?”)

Até no chinês a avó Luísa achava defeitos! (“Porque têm eles de ter aquelas letras tão estranhas? As do resto do mundo não servem? Qual será a necessidade de ter letras diferentes das de todos os outros?”)

Não que Sara não gostasse de português, até tirava notas excelentes, comparadas com as da Mariana, mas já estava um pouco farta de tanta esquisitice da avó Luísa. Já com a avó Rute, passava-se exatamente o contrário.

- Olá, Sara! Então, como estás? Ai que “cresciditinha”! A gente já não se vemos, há tanto tempo! Há-des de ir um dia passar umas horas lá a minha casa! Já nem lembra a última vez que lá fostes!

A avó Rute adorava a sua neta Sara, e a Sara adorava a avó Rute, mas, cada vez que ela cometia aqueles erros, só em poucas frases, sentia um arrepio. Aquele era o discurso favorito da avó, com certeza. Cada vez que via a neta, era sempre aquilo que dizia, sempre as mesmas palavras, sempre os mesmos erros. Sara respirava fundo, sorria e falava com a avó, tentando esquecer que ela estava constantemente a “pontapear a gramática”, como dizia a avó Luísa. Mas o pior nem eram os erros da avó Rute, nem a mania da avó Luísa. O pior mesmo eram os jantares de Natal. Aí, parecia que a casa ia cair!

- Boa noite! Então como estão aqui as gentes? “Trusse” couves e cenouras p’ó bacalhau! Vocês “nã” comprarem couves, “pô” não? Tenho aqui um saco cheio delas!

O melhor que Sara tinha a fazer era ignorar a avó e falar com os primos de Espanha ou com os de Viseu. Ainda bem que havia mais gente na mesa, para ela se distrair daquelas discussões constantes. Mas, mesmo assim, ninguém se abstraía completamente da contínua berraria.

- Dona Rute, sabe que eu tenho muita consideração por si, mas a senhora tem de corrigir esses seus erros.

- Ó senhora dona Luísa…- começava a outra.

- “Senhora dona” não dá. Ou diz senhora ou diz dona, decida-se!

- Pronto, pronto! Mas olhe que eu aprendi muito mais melhor o português…

- Dona Rute, não se diz “mais melhor”! O correto é…

- Mas, se não se diz, por que é que a senhora dona Luísa o disse? - perguntava a avó Rute, com um ar sério, só para arreliar a avó Luísa.

- Ai, ai, Santo Deus! Este idioma tão bonito a ser destruído! Ai, como será o futuro desta bela língua?! Cada vez a destroem mais!

- A gente não destruímos nada!

- Parece que já vejo o futuro da humanidade: tudo a falar inglês!

E por aí seguia a discussão, sem ter fim e sem trazer vantagem para nenhuma das duas. A avó Rute achava a Luísa uma picuinhas; a avó Luísa achava a Rute uma analfabeta. E assim permaneciam: a achar mal uma da outra e sempre a guerrear Até que, uma vez, numa Noite de Natal, na casa da Sara, jantavam bacalhau com cenouras e couves, como era habitual. Lá estava a grande árvore de Natal, como sempre, e as avós a discutirem, enquanto a Sara conversava com os primos. Mas o final daquela noite não foi igual aos outros…

Por aquela hora, normalmente, as avós já tinham ido para casa, mas, por causa do frio e de uma tremenda tempestade, elas ficaram na casa da Sara, e era naquela hora que se fazia as contas do jantar (embora as avós só costumassem pagar a sua parte, no dia seguinte).

- Então são 280 euros no total, - disse a mãe - o jantar, as bebidas e tudo. Ou seja, isto a dividir por 14 pessoas, aliás, 8, porque os miúdos não entram para as contas. Vou buscar a calculadora para ver quanto dá…

- Essa agora! - interrompe a avó Rute. - Atão não se percebe logo que se dá 35 “êros“ por pessoa?

Todos embasbacaram. Todos, menos a avó Luísa.

- Dona Rute, “atão” não existe, e…

- Avó, agora não! Avó Rute, resolve esta conta…

Depois de darem umas contas à avó Rute, a Sara, os primos e até os tios e os pais da Sara ficaram pasmados… A avó Rute era uma máquina! Mas nem foi essa a maior revelação da noite…

O temporal aquietou e já iam todos a sair, quando a avó Luísa disse:

- Sabe, dona Rute, a senhora pode pontapear a gramática até mais não, mas percebe muito mais das matemáticas do que eu. Tenho de admitir! Quem sabe não temos umas aulas uma com outra?

Todos riram, e a avó Luísa quase nunca mais corrigiu a avó Rute com desdém, pois, só cá para nós, aquela sabe muitas letras, até elas entrarem nas equações!